São Paulo: Arrecadação municipal cresce 74% após ação da CGM-SP contra a máfia do ISS

Após a identificação do esquema que desviou R$ 500 milhões de recursos que deveriam ser recolhidos aos cofres municipais por empresas do setor imobiliário para o pagamento do Imposto sobre Serviços (ISS), o valor arrecadado pela Prefeitura de São Paulo com o tributo teve um aumento de 74%.

A investigação que levou à identificação do esquema, comandado por auditores fiscais da Prefeitura, foi conduzida pela Controladoria Geral do Município (CGM-SP) em parceria com o Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP). Quatro servidores já foram demitidos pela Prefeitura a bem do serviço público. No início de agosto, o MP-SP ofereceu denúncia contra 11 envolvidos no esquema. Os ex-auditores fiscais foram denunciados por concussão, formação de quadrilha, associação criminosa e lavagem de dinheiro. O MP também requereu à Justiça a decretação da prisão preventiva de Ronilson Bezerra, por ser considerado o chefe do grupo criminoso e ter tentado obstruir a investigação.

Arrecadação chega a 63 milhões 

A Secretaria Municipal de Finanças adotou uma série de medidas para evitar novas fraudes no recolhimento dos tributos, como a informatização do processo. Em 2014, a arrecadação com o ISS atingiu R$ 63 milhões, o que representa um aumento de 74% em relação ao arrecadado em 2012, último ano de atuação do esquema. Além disso, a secretaria notificou 689 empreendimentos suspeitos de terem recolhidos valores inferiores mediante pagamento de propina aos fiscais. Foram lavrados autos de infração que superam R$ 33 milhões.

IPTU

Durante as investigações também foram encontrados indícios de que os fiscais ofereciam às mais de 400 empresas beneficiadas pelo esquema uma espécie de “combo”. Além de recolher, em média, apenas 10% do ISS devido, as empresas corruptoras também poderiam lançar áreas construídas inferiores às reais e assim pagar um valor menor a título de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). De 73 empreendimentos vistoriados pela Prefeitura até julho de 2014, 47 apresentaram indícios de irregularidade. Esses imóveis sofreram atualização cadastral, que deve agregar R$ 728 mil por ano à arrecadação do IPTU.

Entenda o caso

O esquema foi descoberto após uma investigação conjunta da Controladoria Geral do Município (CGM-SP), do Grupo de Atuação Especial de Repressão aos Delitos Econômicos (GEDEC) e do MP-SP, e resultou em uma grande operação, realizada em outubro de 2013, na qual Ronilson, Barcelos, Di Lallo e Luís Alexandre foram presos. A operação resultou, ainda, na apreensão de um grande número de documentos digitais e em papel que comprovaram o esquema criminoso e levou a Justiça a decretar a indisponibilidade dos bens de todos os agentes públicos que, com o dinheiro da propina recebida, construíram patrimônio superior a R$ 100 milhões com o dinheiro desviado dos cofres públicos.

Dentre os bens adquiridos criminosamente e sequestrados pela Justiça estão apartamentos de luxo, flats, prédios e lajes comerciais, em São Paulo e Santos, barcos e automóveis de luxo, uma pousada em Visconde de Mauá (RJ) e um apartamento duplex em Juiz de Fora (MG).

Os ex-agentes fiscais denunciados armaram um esquema na Secretaria Municipal de Finanças pelo qual cobravam propina para alterar os valores residuais de ISS que as empresas deveriam pagar para obtenção da Certidão de Quitação do tributo, condição para obtenção do “habite-se”.

Planilha encontrada na residência de um dos denunciados revelou que em pouco mais de um ano (de junho de 2010 a outubro de 2011), o grupo recebeu R$ 24,5 milhões em propinas. Como exemplos, recebeu R$ 4,9 milhões da incorporadora Brookfield, R$ 775 mil da Tarjab Incorporações Ltda.; de R$ 460 mil da Trisul S.A., R$ 125 mil da Onoda Construtora e Incorporadora Ltda, e R$ 64,8 mil da AMF Incorporação, Administração e Participação.

De acordo com a denúncia, mais de 400 empreendimentos imobiliários na capital foram regularizados após pagamento de vantagem indevida à quadrilha.

Boa parte do dinheiro obtido ilicitamente era depositada em contas de empresas de propriedade de familiares dos ex-agentes públicos, ou deles próprios, como forma de camuflar a origem dos recursos, o que também foi feito registrando, em nome dessas empresas, imóveis adquiridos com o dinheiro da propina. O cruzamento de dados entre o material apreendido nas residências dos denunciados e as informações requisitadas na Prefeitura de São Paulo demonstrou a coincidência entre as datas dos depósitos realizados em contas das empresas dos denunciados e a emissão dos Certificados de Quitação do ISS dos empreendimentos.

“A análise da quebra do sigilo bancário de Carlos di Lallo apontou, ao menos, 156 depósitos em dinheiro realizados em sua conta pessoal, cujos valores totalizaram R$ 622.559,00, entre fevereiro de 2010 e agosto de 2012. Outros 236 depósitos, também em espécie, foram realizados na conta da CCBV Hotelaria, em manobra de ocultação e dissimulação de capitais de origem criminosa”, diz a denúncia. Os promotores de Justiça do Gedec também descobriram contas abertas em bancos do exterior por alguns dos membros do grupo, com mais de US$ 1,5 milhão em depósitos.

A denúncia é resultado de 15 meses de investigação, iniciada em abril de 2013, e tem cerca de 12 mil páginas, divididas em 61 volumes.

As investigações do Gedec continuam em relação a outras empresas suspeitas de pagar propina à organização criminosa montada pelos ex-agentes públicos, e também em relação a outros agentes fiscais que podem fazer parte da organização criminosa desbaratada, além de empresas e empresários supostamente envolvidos com lavagem do dinheiro obtido com o esquema.

Os denunciados

Ronilson Bezerra da Silva foi denunciado por formação de quadrilha e associação criminosa, pelo crime de concussão por 56 vezes, e pelo crime de lavagem de dinheiro por 89 vezes;

Eduardo Barcellos foi denunciado por formação de quadrilha e associação criminosa, pelo crime de concussão por 45 vezes, e pelo crime de lavagem de dinheiro por 14 vezes;

Carlos Di Lallo do Amaral foi denunciado por formação de quadrilha e associação criminosa, por formação de quadrilha e associação criminosa, pelo crime de concussão por 45 vezes, e pelo crime de lavagem de dinheiro por 251 vezes;

Luís Alexandre de Magalhães foi denunciado por formação de quadrilha e associação criminosa, pelo crime de concussão por 56 vezes, e pelo crime de lavagem de dinheiro por 58 vezes;

Amílcar Cançado Lemos foi denunciado por formação de quadrilha, pelo crime de concussão por 11 vezes, e pelo crime de lavagem de dinheiro por 16 vezes;

Cassiana Manhães Alves, esposa de Ronilson, foi denunciada por associação criminosa, pelo crime de concussão por 45 vezes, e pelo crime de lavagem de dinheiro por 89 vezes;

Henrique Manhães Alves, cunhado de Ronilson, foi denunciado pelo crime de lavagem de dinheiro por 33 vezes;

O contador Rodrigo Camargo Remesso foi denunciado pelo crime de lavagem de dinheiro por 12 vezes;

Clarice Silva do Amaral, esposa de Carlos Di Lallo, foi denunciada por associação criminosa, pelo crime de concussão por 45 vezes, e pelo crime de lavagem de dinheiro por 251 vezes;

Maria Luísa Lemos, esposa de Amilcar Cançado, foi denunciada pelo crime de lavagem de dinheiro por 16 vezes;

Aline Lemos, filha de Amílcar Cançado, foi denunciada pelo crime de lavagem de dinheiro por 10 vezes.

O Ministério Público também requereu à Justiça a decretação da prisão preventiva de Ronilson Bezerra, em razão de ser ele o chefe do grupo criminoso, além de ter tentado obstruir a investigação, pressionando testemunhas, destruindo provas e utilizando influência política para prejudicar o trabalho investigativo que desbaratou o esquema de cobrança de propina no cerne da Subsecretaria de Finanças do Município de São Paulo.

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